1942

 

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1942

Isabela Albuquerque

Isabela Albuquerque nasceu em Goiânia, Goiás, em 1994. Sempre foi uma grande apaixonada por histórias, tanto fictícias quanto reais, da Segunda Guerra Mundial. Atualmente cursa Letras com Licenciatura em Inglês na Universidade Federal de Goiás. Já possui um livro publicado pela CEPE Editora de Pernambuco.

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Sumario

Capítulo I.....................................................................................Lukas Hummels

Capítulo II ..........................................................................................Olimpíadas

Capítulo III ...........................................….............................................Ano Novo

Capítulo IV ...............................................................................................Intrigas

Capítulo V ..........................................................................................Casamento

Capítulo VI .................................................................................................Fugas

Capítulo VII .................................................................Campos de Concentração

Capítulo VIII .....................................................................................Esconderijos

Capítulo IX .............................................................................................Histórias

Capítulo X ..........................................................................................Stalingrado

Capítulo XI ........................................................................................Bombardeio

Capítulo XII ...............................................................................................Cartas

Capítulo XIII ...................................................................................Eu Amo Você

Capítulo XIV ..............................................................................................Adeus

Epílogo

Para todos que um dia me apoiaram

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-- CAPITULO UM --

LUKAS HUMMELS

Verão de 1936

— Você está magnífica — Gerhard disse orgulhosamente ao entrar no quarto da filha, sua mão ocupada com um copo de uísque.

Lydia agradeceu com um aceno de cabeça, ainda se olhando no espelho. Sua mãe estava a alguns metros de distância, admirando pai e filha com um olhar perdido porém afável. Johanna, sua irmã, estava no outro cômodo, pronta para sair.

Lydia iria completar vinte anos em quatro dias. O evento daquela noite era precisamente para arranjar-lhe um marido inteligente, muito comportado e que estivesse no exército alemão, a única exigência de seu pai. Por mais que Lydia não concordasse com a regra — ou com o fato de casar em si, já que sequer tinha começado direito a faculdade —, ela tinha que ceder. Viver embaixo do teto de uma das pessoas mais ativas no sistema nazista não era algo que ela prezava muito.

Ela tinha somente dezenove anos, mas sabia que Hitler declararia guerra em poucos anos e que as medidas tomadas contra o povo judeu eram completamente sem nexo e injustas. Mas ela não poderia sequer sonhar em falar isso em voz alta. Se não fossem as tropas de Hitler invadindo sua casa no momento em que fechasse a boca, seria seu pai dando-lhe uma bofetada na bochecha. Lydia sabia o que acontecia com as pessoas que discordavam de Hitler, e sua vida depois disso não era nenhum mar de rosas.

Lydia virou-se e sorriu para os pais. Eles retribuíram, acenando para que ela não se demorasse muito. Suspirou, lançando um último olhar ao seu reflexo e murmurou antes de sair:

— Me deseje sorte.

O pior de estar em uma confraternização do governo não era a comida ou o gramofone tocando um jazz americano, e sim a conversa. Por todos os cantos, generais e empresários, soldados e cozinheiros, todos eles falavam sobre uma única coisa: nazismo. Lydia se afastara dos pais e da irmã à procura de um lugar calmo sem elogios à Hitler e ao governo, mas era simplesmente impossível.

Tentar argumentar com algum deles era tão terrível quanto ouvir sua adoração pelo Führer, por isso Lydia se mantinha distante, apenas acenando com a cabeça quando seu nome era chamado. Após o jantar ter sido servido, Lydia sentou-se na varanda da casa, admirando a bela Berlim lá embaixo por dentre as colinas.

A casa onde estava era de um general consideravelmente famoso que ela não decorara o nome. Ele morava na alta parte da cidade, nos subúrbios de Berlim, e possuía uma influência invejável — pelo menos para Gerhard — no governo. O pai de Lydia estava ali para estabelecer alguns negócios e cobrar de oficiais que se achavam espertos demais; ele trabalhava no ramo de consultoria financeira. Ah, e, claro, arranjar um marido para a filha.

Ela tinha visto alguns soldados bonitos e até conversara com eles, mas nenhum tinha lhe chamado à atenção. Lydia nunca gostava muito da companhia de garotos — eles eram convencidos demais e geralmente muito bobos. Ela tinha amigas na faculdade, naturalmente, que sempre reclamavam sobre querer um namorado e essas coisas, mas nessa parte da discussão ela somente ouvia e não opinava muito.

Obviamente, já beijara um ou outro garoto durante a adolescência, por brincadeira, mas nunca sentira a “chama” que suas amigas falavam tanto. Lydia se perguntava constantemente o que havia de errado com ela.

Estendeu a taça de champanhe para uma garçonete que vinha da cozinha, bem atrás da varanda. Olhou fundo em seus olhos castanhos, e, ao contrário das outras garçonetes, esta não abaixou o olhar. A garota parecia desafiá-la a fazer alguma brincadeira, como provavelmente acontecera durante toda a noite.

Lydia sabia que a menina era judia. Um simples olhar bastava para que ela soubesse disso; Hitler se encarregara de marcar as características dos judeus para que todos os conhecessem e os desprezassem. Lydia não era assim, mas a garçonete não sabia disso. Antes que pudesse dizer alguma coisa, a garota judia empinou o nariz e saiu do local, deixando uma Lydia surpresa para trás.

— Este lugar está vazio? — Uma voz masculina perguntou tímida. Lydia se sobressaltou e logo revirou os olhos. Deveria ser mais um dos alunos-soldados querendo levá-la para casa em busca de algo mais.

Porém, ao levantar os olhos, Lydia encontrou um sorriso afável e olhos ternos virados para ela. O garoto não deveria ser muito mais velho que ela, tinha olhos verdes brilhantes e um cabelo curto e loiro lustroso. Usava a farda do exército alemão, mas isso não fez o sorriso de Lydia diminuir. Ele era adorável com suas bochechas enormes.

— Está. — Lydia chegou mais para o lado para que ele sentasse. O garoto carregava um prato cheio de pudim de chocolate. — Sente-se.

Lydia não sabia por que estava sendo tão legal com o garoto. Geralmente ignorava todas as tentativas de aproximação. Alguma coisa nos olhos dele a fazia perceber que o garoto pertencia àquele lugar tanto quanto ela. Ele sorriu, se servindo de um pedaço de pudim.

— Meu nome é Lydia — disse, vendo que o garoto estava muito ocupado devorando o pudim para falar alguma coisa. — Lydia Müller.

Ele engoliu o pedaço da sobremesa rapidamente para responder. Quando seus olhos encontraram os dela, estavam cheios de lágrimas.

— Lukas — disse ele, tossindo. — Lukas Hummels.

Lukas a analisou por inteiro antes de focar no pudim e comer outra fatia, mais calmamente dessa vez. A garota riu.

— É filha de Gerhard Müller, certo? — Lukas perguntou com a boca cheia. Lydia assentiu, ainda com o sorriso bobo. Lukas era incrivelmente adorável. — Seu pai me pegou e me apresentou a várias pessoas que ele conhecia hoje. Só me livrei dele quando fui ao banheiro.

Então eles tinham algo em comum além dos cabelos loiros, Lydia pensou, deixando que Lukas terminasse seu pudim silenciosamente. Ela franziu o cenho, pois não se lembrava de ter visto Lukas durante o jantar, e ela andara com a família a sala do tal general dono da casa inteira um monte de vezes. Talvez ela estivesse ocupada demais fugindo dos outros garotos para reparar em um só. Afinal, todos eram altos e loiros. Fugir de um significava fugir de todos.

— Você é soldado? — indagou Lydia, tentando manter a conversa, uma vez que Lukas terminara a sobremesa.

— Sim, eu sou. — Lukas limpou a boca enorme com os dedos de modo bem indiscreto. Em qualquer outra pessoa, ela teria achado um ato nojento, mas em Lukas era algo bonitinho. — Eu era da Juventude Hitlerista, me formei ano passado, agora estou no exército. Seu pai é contador do meu. Eles concordaram que me trazer aqui seria a melhor forma de conseguir alguma promoção rápida.

Agora, Lydia vasculhava a mente em busca de algum momento em que encontrara um homem parecido com Lukas Hummels nas vezes em que fora ao escritório do pai. Infelizmente, ela não achou nenhum.

— Aparentemente, estou preso nessa profissão — Lukas murmurou com raiva, encarando o chão.

Lydia arregalou os olhos. Nunca ela ouvira um jovem no exército dizer aquilo. Comumente se concentravam em informá-la a quantidade de dinheiro que eles poderiam fazer. A maioria deles queria ir ao campo de batalha, lutar pela Alemanha. Fazer de tudo para que sejam notados não apenas pelas mulheres, mas também pelo Führer.

— Desculpe. — Lukas pareceu perceber o que disse e olhou para os lados, assustado, esperando que uma bomba caísse sobre ele, ou que a SS surgisse da sacada para prendê-lo. — Eu não deveria ter dito isso.

Ele é contra o sistema, Lydia pensou. Ela nunca encontrou uma pessoa que fosse contra Hitler — e, se tivesse encontrado, a pessoa não tinha lhe dito por medo. Em algum lugar daquela casa, seu pai deveria estar aos pulos, pois para Lydia Müller, Lukas Hummels era o homem com quem deveria se casar.

— Não tem problema — disse, dando tapinhas de consolação no ombro dele. Era a primeira vez que tocava alguém desconhecido sem sua expressa permissão. Tinha sido uma sensação boa. Lydia se inclinou e sussurrou no ouvido do garoto: — Eu também não concordo.

Afastou-se, e Lukas arregalou os olhos. Lydia provavelmente sabia o que ele deveria estar pensando: ela, filha de Gerhard Müller, um dos empresários mais influentes no governo de Hitler, contra o Führer que o pai adorava, ou melhor, idolatrava? Parecia impossível, mas era a verdade.

Lydia jamais contara aquilo para ninguém, no entanto. Sempre ficava remoendo seus pensamentos enquanto seus pais riam dos judeus e dizendo que não era nada além do merecido o que estavam sofrendo. Lukas era o primeiro a saber de sua posição política, ele era um cara bem importante agora.

— Bem incomum, tenho que admitir — Lukas disse depois de um silêncio constrangedor. Lydia concordou com a cabeça. — Mas acho que é justo. Uma coisa compensa a outra, sabe?

Lydia riu da expressão seriamente risonha dele. Ela riu por uns bons minutos até Lukas acompanhá-la. Deus, ela tinha que admitir que talvez nunca risse daquela maneira com as amigas da faculdade. Naquele momento, ela soube que Lukas era o garoto certo.

— Lydia Müller! — A voz de Gerhard fez a garota saltar do banco, se afastando alguns centímetros de Lukas. Seu pai poderia adorá-lo, mas ser pega sozinha com um rapaz era quase um crime. — Está aí?

— Estou aqui, sim — Lydia respondeu, conferindo se a distância entre ela e Lukas era segura. Como o garoto quase caía do banco, e ela também, tudo estava nos conformes.

Gerhard entrou na varanda, olhou para os lados e sorriu ao achar Lydia. Estreitou os olhos na direção de Lukas, mas também sorriu ao vê-lo. Abriu os braços receptivamente para a filha, que se levantou tímida e caminhou para ele. Mas não queria deixar Lukas sozinho.

— Vejo que conheceu Lukas! — Gerhard trovejou animado, abraçando-a de lado. Lydia sentiu pena de Lukas, que permanecia no banco, parado no mesmo lugar para onde ela o empurrara, corando furiosamente. — O rapaz está ficando vermelho! — Russel riu.

Lydia quis enfiar a cabeça em um buraco e nunca mais sair.

— O que quer, pai? — Lydia mudou de assunto rapidamente, preocupada se Lukas pudesse se transformar num molho de tomate por causa da vermelhidão que assumira seu rosto.

— Já vamos embora — o pai disse, agora mais sério. — Contratos estão fechados e outros estão sendo feitos. É claro, e alguns estão sendo promovidos. — Ele deu uma piscadela para Lukas.

Lydia rolou os olhos, soltando-se do aperto de Gerhard. Uma ideia lhe ocorreu de repente. Ela precisava ouvir mais sobre Lukas e as ideias que ele tinha. Precisava conhecê-lo melhor. Lukas era mais misterioso e inteligente em uma conversa de meia hora que qualquer soldado que já conhecera.

Ela fez um sinal quase imperceptível para que Lukas pudesse fazer alguma coisa, mover-se. Infelizmente, Lukas parecia também ser o garoto mais lerdo que ela conhecera.

— Ah, sim! — ele exclamou, ficando de pé. Gerhard o encarou, curioso. — Senhor Müller, se me permite, posso levar a senhorita Müller até em casa?

Ela arqueou as sobrancelhas, fingindo surpresa. O pai pareceu considerar a ideia. Estava tarde e, mesmo com a polícia andando pelas ruas, era perigoso. Mas Lukas era um soldado do exército alemão, o que deveria bastar para Gerhard, porque ele acenou animadamente com a cabeça e puxou Lukas para um aperto de mão caloroso.

— Cuide bem dela, entendeu? — Lydia pôde ouvir o que Gerhard dissera a Lukas e sufocou uma risada.

Gerhard largou um ainda perplexo Lukas e se despediu dela com um beijo na bochecha.

— Vejo você mais tarde, Lyd — ele falou, saindo da varanda.

Lydia aguardou que os passos de Gerhard fossem abafados pelo barulho vindo de dentro da casa para olhar para Lukas, tentando segurar o riso.

— O que foi aquilo? — Lukas indagou confuso, oferecendo o braço para que Lydia o acompanhasse.

— Minha forma de podermos conversar tranquilamente — respondeu Lydia, puxando o garoto para fora da sacada. — Agora vamos.

***

— Meu pai não é do exército, mas é bem favorável ao governo de Hitler — dizia Lukas distraído, as mãos nos bolsos da calça, enquanto Lydia o observava atentamente. — O seu pai faz a contabilidade da confeitaria e, pelo que eu sei, os dois são bem amigos.

Lydia assentiu. Ela nunca vira o pai do garoto em nenhum dos inúmeros jantares que Gerhard dera ao longo dos anos. Lukas não podia estar mentindo, no entanto, por que seu rosto era a face da verdade; ele não conseguia esconder suas emoções muito bem.

— Estava na Juventude Hitlerista e entrei direto para o exército nesse ano — ele continuou, tropeçando em um ladrilho na rua. Lydia o segurou antes que pudesse cair. — É mais ou menos legal estar lá, eles dão comida e abrigo, e os garotos são divertidos.

Lukas parou de chofre, fazendo com que Lydia quase se chocasse com ele. Sua expressão, antes calma e tranquila, tinha se transformado para uma séria demais para seu rosto infantil. Lydia franziu a testa, se perguntando o que acontecera.

— É horrível — disse, em um tom tão baixo que Lydia teve de se inclinar para poder ouvi-lo melhor. — Digo, o que os oficiais ensinam. Terrível. Os judeus são tratados como vermes, como se não fossem humanos. — Lukas fez uma careta de desgosto. — Eu não acredito nisso, mas tenho que ficar de boca fechada. Outro dia, esse garoto apanhou somente por que disse que a avó era judia. Nunca mais o vi. Tem gente que diz que ele foi expulso.

Lydia engoliu em seco. As coisas eram piores do que imaginava. Como Gerhard era um fanático nazista, as informações que conseguia do pai eram sempre parciais ao partido de Hitler. Nunca era algo confiável. Mas com Lukas ela podia ouvir, pela primeira vez, um lado não corrompido daquele país.

Lukas voltou a andar, com Lydia quase correndo para acompanhá-lo. Ela conseguiu se postar ao lado dele, mas o garoto estava novamente calmo e aparentemente não queria falar mais nada. Ela entendia. Lydia sabia o que era ter medo de dizer algo e se arrepender.

— Viramos a esquerda agora — ela guiou quando Lukas tentou ir à direção contrária. Lydia pegou seu braço e sentiu um arrepio percorrer o corpo. Lukas era quente, mesmo por cima da farda pesada.

— Ah, sim — Lukas murmurou envergonhado, deixando que ela o guiasse pela rua.

Do fim da rua, Lydia podia ver sua casa, relativamente menor que a do general que visitara essa noite. Estreitou os olhos para poder ver que apenas a luz da sala estava ligada. Imaginou o pai lendo pela milésima vez Mein Kampf na poltrona à sua espera.

Confiante de que Gerhard não a faria passar vergonha ou fazer seu novo amigo parecer um tomate maduro, ela caminhou mais perto de Lukas. Nenhuma palavra foi dita durante o curto trajeto. Ela tirara umas boas informações de Lukas, mas um segundo encontro pudesse dar a ele mais liberdade e segurança para falar mais.

— Bem, aqui nós estamos — Lydia disse timidamente, apontando para o portão bem adornado no final da rua.

Lukas sorriu envergonhado, encarando o chão vivamente. Lydia agiu por impulso: puxou o garoto pela gravata e deu um beijo em sua bochecha, sem se importar se seu pai estivesse na janela da frente espiando. Sentia como se fosse uma recompensa por Lukas ter sido tão gentil e adorável com ela.

— Boa noite — Lukas disse, as orelhas vermelhas. — E-eu... Podemos nos ver novamente? É... Q-qualquer dia... eu não sei...

— Terça à noite — decidiu Lydia rapidamente. Ela sorriu e Lukas retribuiu. Os olhos dele brilhavam mais que o luar em cima deles. — Eu estou de férias, então praticamente ficarei o verão inteiro aqui.

Eles permaneceram se fitando por mais alguns minutos sem dizer nada, até que Gerhard Müller apareceu no batente da porta de entrada, pigarreando para chamar a atenção de Lydia.

— Vamos, Lyd — ele disse.

Lydia finalmente desviou o olhar, pela primeira vez irritada com alguém que interrompia uma conversa sua com um garoto. Ela deu um beijo na bochecha de Lukas novamente e saiu saltitando para entrar em casa. Entrou primeiro e deixou que o pai fechasse a porta. Ao olhar pela janela, Lydia viu um confuso Lukas dar meia volta e sair da propriedade deles aos tropeços.

— Gostou dele, hein? — Gerhard indagou com um sorriso afável ao ver Lydia, ainda aos pulos, subir as escadas.

— Ele é um bom garoto — ela respondeu contente. — Vou vê-lo de novo na terça.

Sem esperar um comentário do pai, Lydia correu para seu quarto, pronta para escrever o que Lukas lhe contara em seu diário.

***

Lydia encontrou-se com Lukas na terça-feira como prometido. Também o viu na quinta-feira, na sexta-feira e passou uma tarde muito divertida com ele e seus irmãos no sábado. Ela sabia que não deveria vê-lo tanto em tão pouco tempo, mas simplesmente não conseguia evitar: Lukas era um menino muito educado e timidamente charmoso.

Ela descobriu muitas coisas sobre o garoto. Por exemplo, a cidade natal dele era Frankfurt, mas mudara-se para Berlim aos doze anos de idade. Ele fora um dos primeiros a se alistarem na Juventude Hitlerista — não que o garoto soubesse o que estava fazendo à época. Ele gostava muito dos filmes americanos, embora a distribuição na Alemanha fosse bem escassa. Lukas adorava seus irmãos mais novos, uma coisa que ela nunca fora capaz de entender, já que Johanna a tratava como um objeto de muito mau gosto comprado pelos pais.

O melhor de estar estabelecendo laços com Lukas era que Gerhard o aprovava, ou seja, deixava Lydia ir para todos os lugares, contanto que Lukas estivesse com ela, é claro. Assim, ela passou seu aniversário com o garoto, e três maravilhosas semanas de suas férias de verão. Lukas não a forçava com nada — beijos, e seja lá o que as mulheres faziam com os homens por aqueles dias —, apenas se contentava em abraçar Lydia de lado e agarrar a sua mão como se sua vida dependesse disso.

As Olimpíadas seriam em uma semana, e Lydia estava animada, pela primeira vez. O evento mobilizara Berlim nos últimos meses e tudo o que ela queria fazer, como amante de artes e esportes, era presenciar a abertura. Talvez tenha sido o único momento em que ela pedira ao pai para que usasse sua influência no governo e conseguir alguns ingressos. Gerhard, como sempre, não decepcionou e trouxe para casa, alguns dias antes do primeiro dia, dois pares de ingressos para o camarote pessoal de Hitler.

— Uau, pai! — exclamou Lydia animada, considerando em dar ao pai um abraço. — Isso é incrível!

— O quinto ingresso é para Lukas — Gerhard confidenciou quando a garota o abraçou. Lydia franziu o cenho; seu pai deveria gostar muito do garoto. — Mas não conte a Johanna. Aposto que ela ficaria chateada.

— E muito — ela comentou, se desgrudando do pai com os dois pares de ingressos na mão. Finalmente seria superior à irmã em alguma coisa, Lydia pensou sorrindo.

Lukas não queria o ingresso primeiramente. Falou que era grande a honra de Gerhard tê-lo convidado, mas que não podia ir. Quando Lydia perguntou o porquê, o garoto se enrolou nas palavras, ficou vermelho feito um tomate e mexia as mãos ruidosamente. Foram muitos minutos cansativos para Lydia até que ela o convencesse plenamente que seria um evento divertido, que eles poderiam conhecer alguns americanos e o próprio Führer.

— Você não tem medo? — ele sussurrou de repente, os olhos fixos nas mãos de Lydia sobre as suas. — Digo, nós o odiamos.

— Ele não olha nos olhos da pessoa quando conversa — disse ela, displicente. — Ou talvez olhe, eu não sei. Mas eu sou uma ótima atriz, e inclusive tomei aulas de teatro semestre passado na universidade.

Ela deu um sorriso sedutor, empurrando o garoto com o ombro, apenas para provocá-lo. Lukas abaixou a cabeça e forçou um sorriso. No segundo seguinte, ele balançou a cabeça em concordância ao pedido de Lydia. A garota tirou as mãos das de Lukas e jogou seus braços sobre ele, beijando sua bochecha. Algumas senhoras que passavam os encararam em tom de reprovação.

— A abertura é em uma semana — ela disse. — Mas como te verei amanhã, e nos próximos dias, eu vou te lembrar disso todos os dias.

Lukas riu, ainda com a cabeça baixa, tentando limpar os restos do batom de Lydia em seu rosto. A garota levantou-se e despediu dele com mais outro beijo, na bochecha direita dessa vez. Tentou conter pulinhos enquanto ia para casa, mas não conseguiu.

Ela iria ver a abertura das Olimpíadas!

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-- CAPITULO DOIS --

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-- CAPITULO TRES --

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-- CAPITULO QUATRO --

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-- CAPITULO CINCO --

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-- CAPITULO SEIS --

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-- CAPITULO SETE --

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-- CAPITULO OITO --

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-- CAPITULO NOVE --

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-- CAPITULO DEZ --

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-- CAPITULO ONZE --

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-- CAPITULO DOZE --

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-- CAPITULO TREZE --

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-- CAPITULO QUATORZE --

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-- EPILOGO --

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