A CASA DO PEQUENO ESTEIO

 

Tablo reader up chevron

2012 / dezembro

A CASA DE PEQUENO ESTEIO

- desconstructa -

Coelho de moraes

ENTRE

ÉDIPO PÉS INCHADOS

E PROMETEU

A perda do falo / tragédia

Falo cetro coronelista de semblante taciturno

A perda do cetro / tragédia

Que rei é esse que se descontrola

no meio da estrada?

Que arrasa negros e índios / que bate nas mulheres?

Sófocles discute / enternece com falas

Todas as bocas se abrem em grita de dor

E os mapas se abrem em estradas novas e mortes e cruzes

No meio da manhã

o sol geme em flâmulas

Bandeiras de vermelho sangue

cobrem a poeira dos cafezais

Da poesia faz-se o liame / da poiesis nasce o drama

poéticos entre imagens / integridade

Potencia / natura / física

Arma-se a tenda nas encostas entre pobres e padres

Arquimedes futuro

A libido do herói entre daimonoi

é Pã é Sátiro é Ninfa subjugados na penumbra

Surgem titãs de fina estampa / roupa cambraia

Prometeu se afigura com luzes e archotes

figuras do saber e da conquista

figuras de novas sementes puras de grãos

Despenca dos altos céus e cria seres de barro

Escravos índios / escravos negros / mulheres

Cospe-lhes na cara

Imaginário da caça e do sossego

descansa na pequena casa depois das chicotadas

Diz o poeta:

"A justiça quer que o saber vá àqueles que sofrem."

Prometeu é preso na montanha e clama vingança!!

A tragédia se dá pela perda do falo

Perde o falo / perde o cetro / perde poder

O SABER

QUE EMERGE DO CORPO

Convenção de leitura / leitura da história

desalinho dos dias / desalinho de forças

noites extravagantes de luas cheias vagabundas

A monumental vaga que se alevanta

explode na praia em murmúrios de vozes doridas

Começa a jornada / o tríplice caminho se faz

soldados e rei / soldados e a guarda

o jovem / o velho / embates

focaliza / ali / dote e sapiência

Proponho / ela propõe / mater inspiradora

Jocasta-madre do poeta

- Vem deitar comigo, irmão

Epicasta mutter de beleza da meia idade

seguir aqui a perspectiva do olhar’

olhar que ultrapassa a primeira aparência

detecta sinais / pavor / sintoma / medo

enfia a lança na mãe / morde o peito da mãe

motor embriológico que funciona / move e impede

Move o saber / impede o conhecer / negações

Ah! O santo salvador da cidade pequena e triste

Viola a mãe / enfia a lança no pai

lança o monstro do abismo

salvador de pés inchados

as tetas inchadas cujo amante busca

borboletas / no campo / voláteis perdidas

não passam de charada poética

Esfinge voraz / desvaginada /

sem saber um heliogábalo moderno

não possui a cidade / a cidade o possui

mata o pai / come a mãe / devora a esfinge

deflora a alma inexistente / o espírito do tempo

a cidade o possui / enfim

certamente enrabado pela cidade dormente

que nem sabe que enraba

fácil enigma para quem olha

para quem quebra-rouba o sonho e olha de cima

o jovem herói / cheio de palavras mal ditas

antecipa a solução inexistente

solução de problemas que ele mesmo criará

experiência de uma vida inteira

infância / futebol / saia e carnaval

Adulta / amante amado

jovem de perna quebrada / violência e ternura

Senilidade / tempo futuro numa ruína de cidade

desconstructa polis que enraba a borboleta

Mas os fragmentos vividos

espalhados pelo tempo / dissipados

mergulhados no esquecimento não valerão

dramas-dracmas de prazer

não serão fiança de retorno do Rei

Tanto melhor!

constituem enigma

o homem adulto não consegue ver

dificuldade em ver / não sabe juntar as peças

cego pelo poder

primitiva dificuldade de entender

primeva síndrome da compreensão tardia

juntando ossinhos do lego

nada mais é que gessar a perna quebrada

quebrada no passado... passado...

perna quebrada... sinal de sorte...

O recente herói da casa desconstruída

ergue monumentos

Muda estátuas de lugar / refaz as obras já feitas / levanta ruínas sobre ruínas quer a glória entre a glória de antigos /

desnecessários heróis brechtianos

Basta a alusão ao segredo da origem

ele se precipita n’outra direção

procura esquecer o segredo

nada a ver com a tarefa inicial

o segredo / inescrupuloso segredo de nascença

está em toda parte imposto a cinzel

é o enigma que Édipo procura desvendar

Fala o poeta:

- “Quando está tentado a viver / começa o combate /

combate desesperado para voltar a si

esforço brutal... brutal! / sem pudor de dominar-se

procura / selvagem / por consciência

sem saber do que trata"

IDOLATRIA

Eidolom / Eikonem

ÍdoloÍcone DaimonImago

Imagem minha sobre o espelho

- Espelho Espelho meu –

Adorei a falsos deuses

quem o fez menos que eu?

Ídolos de pedra sem voz sem verbo

A cruz que um dia veio

não passou de nova mídia

nova crença / nova roupa

Zoolatria sempiterna permanece antenada

boi ou pomba / a serpente? / o dragão?

gato ou vaca / o duende ou anão?

escolha o deus que lhe aprouver

Sob a imagem / meu irmão

o mundo à tona vem

Exposta a obra universal

escondem lá o demiurgo

estátua de pedra / estátua de sal

ídoloimagem / o resto é voragem

que não passou na realidade

DE LENTEJOULAS

E OUTROS ERROS

caro poeta

envio anexada uma flora espalmada como sonho como fado

trago machados e lanças / trago papiros atados para maio

lanço o tema em perspectiva

teu olhar / a visão /

assinada a missiva / rubricados vários temas / desnudada ilusão

manda tua ideia / livre / leve / em peso

caríssimo poeta

Lembra que o sonho é tênue e tão fugaz que nada vale

O trabalho da formiga é ineficaz / demora / desculpa

colibri com a gotinha nunca apaga fogo algum

são desculpas engraçadas / sedentárias / bem burguesas

assim perdura o mundo em sua indiferença de esfinge

O fraco chorará

só perdura em poema antigo

Se há sociedade não haverá igualdade

Poder de opressa civilização / construída e paga / em grega dracma

altera o mundo numa vez / nunca mais se volta ao primo esboço

acredita em mundo novo / acredita em mundo outro

conto de fadas velhuscas

sempre tem um lobo atrás da casa

caro poeta

se eu quiser / um dia / entre oráculos e guias e profetas

tomar do valor do dia-a-dia / o amor das coisas simples

eu não usava NET / não entrava em CHAT

Não ligava carro / nem logava BLOG

careta poeta

esquece o Parnaso

Bilac já dorme em outros berços

eu prefiro alguém que saiba do que faz

em vez do voluntário ineficaz / da formiga / colibri

tá ligado?

Mas escreve assim mesmo / escreve qualquer coisa

Se morresse na montanha ou na praia

Tal história nem seria / nem sereia

Elogia a torto e a direito / o caderno fecha em maio sema as flores

E a WEB nos espera na esquina do futuro

Um abraço

COELHO

... dos Ultimos carnavais

Mangueira e Beija-Flor / são frutinhas e avesitas / Vai-Vai

Vamos nós a copiar / capacho / capachoImpera o mando Imperatriz / foge escravo!

Leopoldina e mendicância / e nós capacho

Corre / foge escravo!

são braseiros / mindubim / são garapas

três vezes... tan-tan-tan... Leopoldineses

Vai-VaiGavião / Vai-Vai Gavião infiel

quero ver desfilar em tanta água

Vai-Sai puxa o saco do prefeito

O capacho que migalhas / quer migalhasMangueira / Beija-Flor / Beija Flor / Beija-Flores

na cidade do Peçanha prioriza a pobreza

dobra em servilismo / povo / dobra a cerviz

o eterno aprendizUnidos! Já-fomos-já vencidos! Unidos

o capacho central da cerviz e das migalhas

Foge escravo / Pô, não ouve?

toma o véu / toma a peruca

no desfile canta e grita / alalaô / mas foge!

tem um tempo / hora e meia

Ah! Não? Vai morar na tua vila, Isabel?Beija-Flor / então / Vai / Gaviões da Fiel/ Vai tarde

Quero ver a água a meio / quero ver a ponte errar Beija-Flor já no biquinho o incêndio apagar

Apagar incêndio algumQue incêndio! carapálida / a cousa é para Acadêmicos

doces ou salgados / da Teresa e do Salgueiro

Valha-me MadreDeus! Quanta chuva /

mas na TV há carnaval!!

Vai-Vai / e quantas vezes for não esquece o bote

Uma tia Nenê que não era de Vila Matilde

Morava na Marechal / que é outra história

sem água / nem cabe aqui...

... do que restar do Império

Do que restar em barro e lama e chuva sem descansoa cidade vai ao fundo emparedada por dementes

tão eleitos quanto cegos

Serão outros os carnavais de Tebas?

A ESFINGE SOU EU

Brutalidade / despudor / selvageria /

sou eu: a Esfinge...

Os vasos se quebram quando tomamos das alças

Séculos antigos separam a profecia da realidade

A Esfinge sou eu: lasciva / despudorada /

devora os belos mancebos

Ninguém entrará na cidade do esteio

a não ser por mim!

A tentação de viver / viver de qualquer jeito /

sou eu: a Esfinge

O rei digno se foi / perdeu-se a noção do rei digno

Esse rei que se mantém ereto /

supliquem senhores... esse rei que se foi

- dele fazem tudo para olvidar -

supliquem senhoras... esse rei que se foi /

sou torre firme / protejo a cidade

Descobrirei / aqui /

bem mais do que minha identidade.

Descobrirei / aqui / que quero viver de qualquer jeito

Descobrirei que quem quer viver de qualquer jeito

tem que ter outra identidade

Descobrirei que é insustentável / a nova identidade

No início / na câmara / na vasta sala das leis /

Eu era um pré-rei digno /

tentava reerguer a cidade /

assim fingia

Reprimindo os desmandos da Cantora-Esfinge /

sabendo que sou eu: a Esfinge.

REGRAS DE TEBAS

...

garantiu as boas regras / troca e sucessão

construção emblema reto / do tempo regra /

regra de união e sucessão

dissolve-se / do início ao fim / lento e doloroso desvendamento / desvelamento

pequenos detalhes causaram o pântano

relações incestuosas afunda Tebas

autofagia afunda Tebas / perde-se o ritmo /

perde-se a regra das gerações

TRABALHO ATÉ NA MORTE

Manda a sociedade / nós obedecemos

trabalho é punição / trabalho é banco aberto

trabalho é lucro alheio / nada mais / nada menos

Que fará o mundo numa eterna greve?

Que fará o chefe sem poder / sem em que mandar?

manifesta tara

Trabalha até morrer / pois a fila é grande

trabalho evitória são hinos danados / ocupam nossa alma

lá na escola / jovem puro ouviu de norma e seduções

Enfiou-nos na cabeça o futuro / o amanhã que nunca veio

Enfiou-nos na cabeça o professor / que já morreu

trabalha para o país / e menino de amanhã

Torpe a ideia a vocação / o dom / talento

Quer saber?

Para de trabalhar / deixa o banco se estrepar / sai da fábrica

Vá fazer poesia / faça música doentia

sobe ao palco / mete o malho

O jornal te espera em brancas folhas: Notícia:

operário agressivo segue ordem densa e dura

sobrecarga de trabalho / a ninguém traz coisa alguma

A vítima sofre dos nervos / o dono da empresa coleta o dinheiro

A vítima se perde nos rumos / o dono da empresa vai a Paris

Notícias:

Nasceram margaridas nos campos

Ninguém veio colher / Muita gente ficou lá

A vítima se perde nos rumos / o dono da empresa vai a Paris

MINICONTO

O sincronismo de andar de Gradiva indica vero fetiche

Gradiva – a que avança, - e Gradisca – a

que agrada ou dá – têm similaridades nas andanças

pela face das ruínas

Amante da arte da corrida de 100 metros

Gradiva esfolou-me a boca desejosa

esfregando-a na areia, assim como quem nada quer

Deixei de desejar seus pés ligeiros

parentes dos pés de Aquiles

se bem que os pés de Aquiles deixavam muito a desejar

Beijar-lhe os pés seria rápido intercurso sexual

Muitas vezes essas sublimações me farão atingir a santidade

É a linguagem do atletismopuro

É matriz de espasmos devendo créditos a Onan

Ah! se corresse como os atletas dos vasos cretenses!

Pés no mais puro afresco... pés

Ao longo da carreira de podólatra fui curador de mostras

Sucessivas mostras

Nunca me esqueci de Gradiva

e seu poder de saltar fora dos relevos em que se metia

e calcar o tornozelo na nossa cara

BASTA

A noite caia fria / molhada sobre gente perdida destroçada

Basta de noites

O dia era lento / sem ordem / sob o sopro quente do vento

Basta de dias

A tarde rubra desabava no costado imenso da montanha glabra

Basta de tardes

Na estrada a trilha abre campo / lenda / ara / abre

outra estrada

Basta de escolha

Nem escolha há

Repetimos tudo desde o primo tempo

Qual matéria repete seu contento

sem saber do que foi feito / do que virá

Basta de escolha e estrada

Basta de trilha / cruzamento

Basta de caminhos vários

O que vier que venha!

LAIO MERECE

LAIVOS DE SANGUE

Dissolução

reviravolta trágica / sorrateira

problema para Édipo /

para nós também / que o amamos com pedras

exige que enfrentemos desamparo bem maior

o abismo insuspeitado de crueldade

sinais desta violência em toda parte

O herói não vê / separa a questão da morte de Laio /

tripla encruzilhada / própria origem / a suspeita

o nascimento vil / filho de escravos / filho rejeitado

enigma que o fascina a ponto de fazê-lo esquecer

da morte de Laio

somente o admite em face a Jocasta

em felatio a seus pés

não há o que ler nas marcas dos seus pés

Angústia

Édipo encoraja a mãe-rainha

não se envergonhar de sua origem’

Ele é também filho de escravos /

igual a crias de animais

São filhos da Sorte

ele mesmo não suporta

ver e aceitar a vista dos pés mutilados

a imagem que da resposta se desfaz

a integridade do velho rei Laio / como homem /

como rei / Tebas Patras

tripla encruzilhada / mortes

quatroacrosticoelemental

Ação / realizAção / do mundo / da ideia / éter

planAstral / psiquInconciente

RáArRá / das fadas o mundo / pensamentHermético

Sílfides molengas de suor

Fogo Salamandra te queima / te convém / contra todo mal

passado /presente / futuro

O desejo / a vontade / mais mudança / tudo muda

purifica em queima lava

Geme a flama ondulante / crepitante em dourada energia

religa um deus alhures

Onde há vela / há fogueira / Luz Divina e Fé Poder

onde há alma... o plasma queima

Amorosa emoção de fluida cauda em tanque lago

nutre o sonho / despertar

Guante azul de fera Ondina / feminina fluida ninfa

esperança líquida goteja

Urge o rio / o mar / o lago sacrOrnamental

urge a grísea linfa oculta

Até quando esperar que se calme a onda / até quando esperar

até quando / até...

Terra e vida bem visível / concretude em pedra e rocha

a semente duralex

Elemento ativo em litográfica assinatura

marca a terra co’a palavra solta

Rasga o ventre em barro e lama / faz nascer AdãoAdamah

faz sentir o éden rôto

Risca a marca em testa Gnomo / cainita testa ampla

foge agora! / tão grande é o crime

Ara o leito frouxo / planta já na areia

vem fazer crescer o orbe / grita e canta melodias!

ESTRATEGIAS

PARA OLHAR O CEU

... morto

... foi / sem o desejar

Heliocêntrico desde criança

defendeu a mudança do céu

radical e completa mudança do céu

estratégia para ver o céu

estratégia no pensar do cosmo

estratégia do olhar humano

- O Sol é o centro de tudo!

gritou do centro de si mesmo

caelum e mundus / clareza e ornamento

antiga escultura antiga

... Morto

caiu de cara nas estrelas que lhe espetaram o olho esquerdo

neocósmica teoria

ah! Danado de especulador celestial

nem gregos nem troianos

a Terra não é o centro do universo!

É o Sol!

Ora / direis /ouvir solares

munido com triquetrum e baculus

sem lentes / solitário / avarento filósofo do céu

morreu matemático

como o mestre Millor /

como o Mestre Millor sofreu todas as operações

felizmente todas matemáticas...

Ah! A geografia das constelações...

confuso e sem sentido / membros perfeitos de corpos diversos

ozimândias do céu

... antes de morrer...

testemunha da diária revolução diária do firmamento

na isolada contemplação do firmamento

... com ou sem nevoeiros...

não temia a vara do bispo ou do inquisidor

Receava os militantes da ignorância

prontos a incinerar cientistas ou vegetais

o que viesse primeiro

... morreu assim mesmo / pois ninguém vira semente

a ciência / água pura / se no chão / virava lama

em sua mão plantou-se um céu

ora / direis / olhar estrelas

morreu aos 70 com a cabeça cheia

a cabeça como céu estrelas

o estrago estava feito e o mundo perdeu seu centro

O POETA ENCARNA

Pelo mensageiro percebe o herói

que fala da cicatriz / simbólica integridade /

física / moral

velho mal inscrito nos pés / tragédia

a cicatriz não tem a função / encarna a postura /

posição - deslocamento

o herói no espaço-tempo

os modos concretos da expressão /

a experiência da criatura dos heróis

elos secretos

o homem civilizado /

a selvageria da natureza / a selvageria das feras

os sinais físicos / a cicatriz dos pés /

é trama de signos / elabora a tragédia /

finitude do infinito da condição humana

figuras míticas da vida da criatura criatural

figura de Prometeu / padrão do saber / padrão da arte humana

CACOS DE GENTE E DE COISA

Cacos

Alma estilhaçada em cacos

Incontáveis

Se quando se falarem negarem os restos

existirão eternos

cacos

Casos de campanhas infindas

Cacos de amigos / cacos de almas

Gente

Dia infindo / perdido nas ruas

Sempre aos domingos / em filas / em listas

Sob luz presa / sol foragido

Lumiando os cacos do rei

Entre calmarias e mares e iras

Coisas

Enormes e belas / deixadas na lama

Cacos de coisas enormes

restos plurais de ares e laços e rosas

Coisas / cacos

Assim como quem ama e esquece

o esperma em útero alheio

Cacos de vida: morte

Cacos de morte: ...

Está para ser caco e ser pouco

construir-se à sombra de um todo que some

ENCONTRO NA ENCRUZILHADA

encruzilhada de três caminhos

viajante a pé não cede o caminho

o arauto de um velho rei não cede caminho

monta-se num carro puxado por mulas

O velho castiga a chicote

O viajante é príncipe / Édipo do pé inchado / que toma o bastão

O bastão apóia frágeis pés frágeis / sinal de crueldade / bastão-clava que abate o rei

O bastão é emblema / sinal do soberano / bastão-cetro / o direito ao trono

o filho exposto ao sol / sobrevivente /

a faceta valente e vitoriosa do exilado

o príncipe de Corinto conquista o trono

MÉROPE E POLÍBIO

O que é oculto / os sinais físicos / a dúvida sobre a origem

O jovem vitorioso um príncipe / assolado está por tristes segredos

Rumores

dúvida se é filho da casa real / de Mérope e Políbio

Os protestos dos pais não apaziguam as dúvidas /

a honra genealógica / a identidade familiar

Édipo

as cicatrizes dos pés / marca aviltante fala mais alto /

rumor humilhante

Em Delfos se pergunta / o silêncio de Apolo /

a assombrosa profecia /

prediz parricídio / prediz o incesto

nebulosa de sinais / dúbios de sinais / o estigma / fora-da-lei / excluído

Édipo auto-exilado / homem perdido / despolitizado /

conquista errante da nova pátria

Apolítico / carência de estato / desamparo social

cego no deserto de areia escaldante

Édipo à mercê / depende de estranhos / finda a altivez aristocrata

seqüelas da ferida antiga / "pé inchado" / o que manquitola /

nobre não mais

Édipo coxo / o passo em falso / o passo manco / a ferida do aleijão

O velho mal dos pés inchados / é dor que Édipo expressa

na tripla encruzilhada / o triplo estigma do filho /

dúbia filiação / dúbia valentia / dúbio equilíbrio /

Édipo é rei como quem anda pelas estradas

FERIDA ESQUECIDA

Ora, esquecer... dirão estrelas... certo perdeste o cetro!

mutilação de forças mentais

gemido doloroso de Édipo

ah! Me chaga agora mensageiro-pastor

olha com pesar e aponta meus pés inchados...

menciona a marca dos pés

mostra o peso do esquecimento

O mensageiro pastor revela o pavor abafado

Revela o torpor / revela a tripla encruzilhada

O mensageiro revela que Laio o amarrou / recém-nascido /

O mensageiro o obriga a conhecer o nome é a marca física dos pés

VERGONHA ESQUECIDA

PES MACHUCADOS

Grito que expressa vergonha / pavor / medo / feridas / cicatrizes

Édipo de nada disso queria /

pensar na cicatriz / pensar na fragilidade

ser Rei é ter firmeza / o rei como a torre forte /

o rei protetor da cidade

"Ai, por que mencionas o velho mal", é firmeza / é conquista

imagens discretas / a atadura de Laio perfurou o recém-nascido / seqüelas

pés inchados / mal cicatrizados / não favorecem a guerra

não favorecem proeza de herói /

não apontam para coisas de guerreiro

a dor que avilta a alma / a dor de Édipo

FRAGRÂNCIAS DE HEROI

todo homem livre é posto à prova / atletas guerreiros

às vezes lutar / ás vezes escrever tragédias

o mal dos "pés inchados" avilta / macula o viril

a flor que não se cheira

Édipo "dos lépidos pés" / Não!

Édipo corredor magnífico / Não!

pés ágeis / supremacia no combate

Édipo Não!

AS MULAS DA ESTRADA

Édipo surge no caminho

Laio montado num carro puxado por mulas

O velho homem / brancas cãs / arauto anuncia /

Que se ceda a estrada ao rei / o rei caminha para Delfos

Gesto frio / gesto apressado / gesto arrogante

o rei ao levanta o chicote /

Laio bate o chicote de duplo ferrão

Édipo o abate pelo bastão

Emblemas fálicos / a justa dos reis

Fallus soberanos

soberania do filho sobre o pai

há algo selvagem / há algo primitivo / algo priápico /

desejo priápico

Édipo fallus

rivalidade primária / ódio violento / lutas e valsas de príapos, pans e centauros,

Saga interminável de danças entre sátiros e silenos

A morte do velho das mulas na estrada de pó e de sangue

Rumo a Tebas

CANTA O CORO

CANTA O INCESTO

Seria Édipo filho de Pan?

daimon natural / selvagem / violento raptor /

farta-se de ninfas nas matas?

parricídio e incesto /

compartilhamos com Édipo oculto desejo

desejo de matar o pai / desejo de casar com a mãe

desamparo / formação reativa

captar o pavor oculto / captar o pavor que eclode /

a angustia / a procriação / a morte

A emoção que Édipo nos causa

O regime da angústia sem nome

parricídio e incesto / clima intangível /

a angústia que livre flutua

reserva de angústia sem imagens concretas

pântanos nebulosos / caça e navegação /

perigo / silêncio / armadilha /

Segue lesto para Tebas

Ilumina-se o traço que o herói descobre

nas poeiras da estrada de mulas

o lado noturno / o lado selvagem do herói /

de Tebas salvador / faro selvagem destrói a esfinge /

antigo sentido / faro selvagem

animais de sobrevivência / lances rápidos /

ardis sorrateiros

rei-sacerdote / solene / grave

Édipo dublê de herói / Édipo duplo humano

Édipo refaz o caminho titã

Édipo Prometeu.

O VELHO MAL DOS PÉS INCHADOS

Quantos olhos há de ter um Édipo?

Assombra e cresce nas sombras da pedras

Frêmito / temor /desânimo

o profeta fareja o avesso

pés inseguros / signo falho / direcionam e afetam

ora guia o rastro / ora impede a visão

Édipo demonstra a presteza do chefe sagaz

- Quem me chama? Que desejam de mim?

previu as demandas de Tebas / antecipa a consulta do oráculo

autoconfiança de rei consciente / aquele que desvendada os enigmas

engaja ativo / direto / corporal /

Édipo manda Creonte / Édipo é tebano tardio

No entanto é tebano vero alí nascido

sentimento profundo / inadequado ao berço /

discursa Laio como pai / como o pai

diz-se filho de padres

pés inchados / estigma que fala / vergonha e medo / silêncio tenaz

O velho mal / vergonha horrível / vergonha do berço

Édipo / além do racional / saber adivinhado

A marca dos pés / desamparo / ele nasceu e cresceu

no gesto de Laio e Jocasta / a vontade de viver /de procriar o estigma da lança / cadeia sem fim / mutilações-mortes se fim

MUTILAÇÃO

gênese dos pés inchados

exegetas

a falha do pé

o velho mal que aflige os pés

cicatriz de Ulisses

inchaço e manco andar

o saber e o inchar

capacidades limites do saber

com o problema da limitação e da vulnerabilidade físicas.

saber onde e pé inchado

Estranhos de quem posso saber onde Está o palácio do tirano Édipo se souberem de onde

inchar Eu sei

tyrannos decidido e confiante

inchar / saber / comentar

o saber / o defeito / a grandeza

o poder inscrito na falha física

desamparo e ameaça na incontrolável doença humana

LAIOS AGRIA

Inteligência de Édipo / começa na ferida / pai medroso e hostil / cinge os tornozelos

amarrar os pés do recém-nascido? Que há de útil neste gesto?

Laio antecipou a morte próxima / inibe o matador / mutila os pés pueris / enfraquece a vítima

despojar a vítima / fim da força viril / vingança do além

Laio mutila o filho / Laio exclui o filho

Não mais o jovem guerreiro / não mais a conquista do poder

Entrega a vítima ao pastor / vai ao mato / ao deserto / vai ao pasto

O abutre encobre o sol / a sombra nefasta se arvora saem folhas

cultivado o selvagem / pastagens ardentes / mundo das feras / mundo da caça

mundo selvagem: criaturas mortas nos campos / boca em formiga / peito exposto ao sol

pés atados

desenhos nos vasos / cenas incontáveis /

caçadores carregam as bestas / volitam borboletas

animais pelos pés atados /

É assim que se faz com os pobres /

carregar pelos pés dianteiros até hoje inda se faz

atar os pés da criança / Jocasta relata detalhes /

Jocata fala que Laio... / como Laio... atou

o mensageiro-pastor descreve como desatou...

membros perfurados / ligas apertadas

Sófocles ressalta detalhes / associa animalÉdipo / humananimal / animal de caça

ato brutal merece vingança / rito desumano da prole /

prelúdio matança / prelúdio despoja

o filho da casa real / decai o filho da casa real /

o príncipe selvagem / grita em precipícios

Sófocles indica etapas / ritual atroz / ordem humana pelo mundo / animal

Édipo é selvagem

FILHO DE PÃ / IRMÃO DE PROMETEU

Traços desconcertantes que lançam sombras

Traços desconcertantes sobre a imagem de Édipo

A ira / a força cósmica / o daimon

Obstinação e impaciência / humor irascível / cor específica

A inteligência do herói / assombroso Prometeu /

o grande titã resiste às ordens de Zeus

Sutileza aguda / perspicácia manifesta / orgulho confiante / seguro êxito

Gestos / palavras / invejável mostra /

Alma truculenta / segurança tranqüila / assume salvar a cidade

Édipo persegue / a missão explode /

excessos de cólera / iras loucas

nada de inibição ou arrependimento

atos derramados contra Creonte / contra Tirésias

Édipo Rei reconta sua história sem tirar os olhos do céu

conta a triste vitória sobre o velho de barba grisea

ato absurdo que se explica por furor passional

furor sanguinário / furor da raça maldita

racionalidade e clarividência: não!

Édipo carrega a tara da estirpe / a cólera destruidora

autodestruidora

herança monstruosa de antepassados monstruosos

A matança na encruzilhada

o pano de fundo

a cólera de Édipo

o mesmo orgulho / arrogância desdenhosa

o velho Laiogolpeado / cai do alto do seu carro

o viajante de pés doridos / desconhecido

que reluta em ceder a passagem.

ÍMPETOS DE TITÃS

E DE DAIMONES

COMO ARMA

CONTRA O DESAMPARO

Contrabalança

De cada lado traço pulsional

De cada lado momento selvagem

as qualidades da razão perdida

o manto barato das fome do deserto

investigação metódica entre gentes do campo

urbanistas de subúrbio

apedeutas originais

Édipo

admirável / lamentável / laboriosa porfia

encadeia causa e efeito,

deduz dos esforços e das veredas vermelhas

labirinto de erros entre alcantilados parques de pedra

esquecimento crasso

Édipo

revisita um a um / perseverança estranha que escrutínio calculado / os fatos / as perdas /

percepção que se esvai

Há quem valorize as qualidades

A caminhada do pajem pela poeira

Os laços de couro prendendo o jovem

A criança chora

O chapéu de palha esvoaça

Gritam na madrugada ou sob o sol

Édipo de um ponto de vista desnudo e solitário

Édipo / herói / Édipo lendário /

Édipo não sucumbiu ao complexo

A vítima presa

dois marcos do passado

fundamentos de uma vida

Tebas e Corinto.

ARMADILHA HUMANAS

Édipo

vítima de si mesmo

cai na armadilha / desobedece a corte

opõe-se a testemunhas

vocifera contra o pretor /

a rede de provas / a incúria / a dívida

Édipo

saiu de Corinto / desligou-se dos pais

a aventura da liberdade

atado a Tebas / berço e sepultura

voltado à morte

quer ver claro e cego no final

modelos da ciência moderna

conquista por meio do próprio valor

conquista a si mesmo

sujeito racional / submete livremente

este primeiro plano se inverte e revela o herói

herói da vergonha / objeto de repulsa

Édipo

sabe esquecer a morte

o sofrimento humano o emociona

empenha-se em salvar

Neo Prometeu sustentável

graças ao oblivion da morte

Édipo

o inominado / condenado à morte

por Laio e Jocasta

A mãe o entrega a um pastor

Que o matassem!

O monte Citeron / a piedade / jogam-no do monte

A árvore útero o recebe / o embala preso aos pés

A árvore / clássico símbolo materno

Édipo jamais conseguiu desamarrar-se da mãe

atado a ela / agarrado à ela /

náufrago se agarra à tábua de salvação

O desamor da mãe é naufrágio

jamais se arrancará da mãe que o rejeitou

Atenas se orgulha da firmeza do chefe

No pior e no melhor das vidas

cautela e prudência

ÉDIPO PREVIDENTE

antecipar perigos / esperança prometeica

refletir / agir / solucionar

ardis dos divinos / miserável desmedida

confiança em abutres /

conhecimento / invenção

truques

repousem sobre fundamento precário

esperança humana é ilusão de pássaros cego

esperança humana é ilusão de pássaro sonhador

heróis obstinados não temem rivalizar com deuses

EU CLAMO POR ZEUS

Édipo se chama de grande / mega Édipo / megan

o deus / diz o coro / é grande nas suas leis

megas theos Édipo possui o império / a estrutura / o estado falível

o império de Zeus é imortal /athanaton archan

Édipo promete força

O coro pede força para Atena

Édipo fala aos tebanos / o pai com seus filhos

o coro apela para o pai / Zeus / Zeus pater

Édipo destrói a Esfinge

O coro pede para Zeus findar a peste

Ecos de deboche / poder de Édipo?

pretensões? / trocadilhos sardônicos

A falha física do tirano esplêndido

Mas Édipo é herdeiro de Tebas / legítimo

A criança rejeitada

OS LIMITES

Na tragédia os irmãos do Titã / medrosos

os limites impostos por Zeus

Hermes mensageiro debocha

infeliz combinação de impotência e orgulho

sofrimento / impotência

a imagem engrandecida / divinizada

dimensão humana essencial

ser desamparado e ferido

Prometeu é o irmão da humanidade

suporta o sofrimento

deixa tudo para trás / sempre sabe do futuro

força e desamparo / confiança longínqua no devir

humana figura titânica

divina sabedoria terrestre

núcleo central do herói / inteligência / determinação

inteligência racional / obscuras desconfianças

formas vagas do saber

PrometÉdipo adivinha

desde o início em não-ditas sombras de palavras

assombrosos habitantes

Édipo se tornou inseguro

pois carrega tristes segredos

sofre de irada intuição

Édipo ativo / cru / irado

Vítima obscura de obscuro assombro

O TORMENTO

Vai que perdeu a contenda!

saber do entendimento finito

nem carregar / nem compreender"

saber que inspira pavor

pensa com nova cabeça

uma grande cabeça

surdo pavor / inarticulado / subtraído

medo imediato / sem nome /

não se manifesta nas imagens

nem sob as bênçãos dos padres sinistros

disponíveis em certas sombra de caverna

manifesta por reflexo / o corpo na parede

retração agressiva / rechaço / defesa

o relato de Jocasta é como Jove no céu

longínquo / inseguro

os pés perfurados / esfolados / encavados

manquitola nas ruas / já não em o viço

o recém-nascido mandado à morte

o adulto do tríplice caminho

aquele que perde na final

SEXO PREMENTE FREMENTE

Centauros / sátiros

São criaturas de desejo sexual incontrolável

Saltam sobre belas pessoas / de qualquer sexo

Pessoas / que ao modo grego /a beleza os excitasse

Rodeado por fálicos emblemas

Laio tem a branca cabeleira

Pois que pássaros e homens peludos são lascivos

mesmo que vindo das areias

DIVIN(A)ÇÕES

Potencial excêntrico / faro divino / daimônico herói

No afã irado de adivinhar

No afã irado de intuir

Édipo jura / condena-se

exílio ou morte

morte ao assassino de Laio!

maravilhosa curiosidade irada

porque o saber / ao romper fronteiras / se atiça

para saber mais do que pode carregar / conter /

caçador carrega no bastão apoiado no ombro

lebres / raposas atados / suspensos / presos os pés

caçador / lebre / bastão / príapo

lebre suspensa / coluna adiante / altar Hermético

casal homossexual / abraçado e nu

homem vestido oferece a lebre a uma senhora que tece

a caça / o prazer do espaço selvagem / hábito violento caça sangrenta / sexunião selvagens

Príapo / Pã

espaço fechado do lar / ritual /

vestimenta requintada / fiar / tecer / bordar

Que remédio o encontrasse para curá-lo

Ergue-se nele cega esperança

a suspeita / o pensamento indomado

peso de triste segredo inseguro

o espírito fiel / meticuloso sofre desmedido

segue o tempo torrencial

Selvagem procura da consciência

Encara a morte ao voltar a viver

Sucumbe em terra o espírito

Domado na rudeza das palavras de servos / lacaios

A fala ao modo das moiras / das parcas / erínias

As falas em formas de ilusão

PAX

Para quem sede e fome de dor

da morte ou da vida

com chaga ou ferida

Para quem tem medo e pavor

Para o grande pequeno medíocre

na vida enxertado / amaro de fel

na morte enterrado / à espera do céu

Para quem é pequeno de grande e de acre

Para quem forja nome na lama e no sal

chaga aberta / vaga incerta

densa fenda / crença insana

Para quem brande em temor o curto punhal

Pax

para os homens

para os de boa e de má intenção

Pax

Não a paz dos rastejantes

mas a calma / tranquila / serena

a paz daqueles que comandam vendavai

DAS MORTES

E

DE ESPELHOS

Na noite de quarta

o Espelho / confrangere refractarium /

o olhar do outro é o sujeito

a imagem que o outro lhe deu / Jocasta / Laio

próximas pessoas

Reconhece a imagem da criança

De onde terá vindo o ser de pés inchados?

Dos montes? Do deserto? Do caminho trifurcado?

Representa-se a existência de Édipo

O espelho possui papel concreto

será ilusório / será falso

contornado por desejos / ideais / sonhos importados?

a imagem como sua / unidade / virtual / alienada

o corpo despedaçado / furado corpo / pés atados

pendurado corpo no ramo do galho / balança

unidade na imagem do outro /

de Rei e Senhor

que é a sua imagem antecipada

confusão entre o eu e o outro /

entre o Rei a criança

O Rei se despede com penas a cumprir

Comment Log in or Join Tablo to comment on this chapter...
~

You might like COELHO DE MORAES's other books...