Frenesi Noturno

 

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SINOPSE

Antes de ser general na Torre Bawarrod, Devon Riezdra era um feroz major a frente de uma unidade de elite conhecida como Strigidae. Eles se movem a noite, em silêncio, em operações de combate e resgate. Esse conto é narrado em várias partes, tomando início no relacionamento de Devon com Cassandra e seu filho Zane, passando por quando ele conheceu Jaylee e seus dias na Ilha.

O sexto decendente da Casa Riezdra revela segredos de seu passado e os motivos ocultos que o levam a buscar a queda da Casa Bawarrod.

+16 anos
COMPLETA!

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Parte 01 - Predadores

Parte 01 - Predadores

 

Um rastro de poeira se ergue por entre as grandes rodas imersas na escuridão noturna. O que resta do batalhão faz silêncio no interior do furgão. O som dos soldados em luto após a última batalha no front. O único barulho é do motor velho com combustível adulterado e da terra sendo revolvida pelos pneus.

Os rostos jovens contém sulcos de tristeza e desânimo, alguns, de sangue. Desesperança. Essa é a palavra que melhor os descreve. Não há beleza na guerra, apenas a fúria. Nada de heróico em alistar-se mais cedo, antes dos dezoito anos. O homem que aparece em cartazes e propagandas e diz "Só depende de você!" mente e manipula, oferece uma ilusão.

São tempos de desespero e morte. As armas que esses soldados receberam não agem com eficácia contra os monstros do espaço, a tecnologia humana parece um brinquedo de criança diante da tecnologia que os seres extraterrestres trazem.

Bloqueio a estrada, o motorista mal vê a hora em que surjo no meio da escuridão. O furgão se choca contra meu corpo, mas o impacto não tem efeito em mim como tem na lataria. O veículo amassa, os soldados berram e o furgão capota.

O acidente ecoa pelo planalto. Pequenas ondas vibratórias surgem na superfície de um lago esquecido. Dura alguns segundos. O silêncio se instala novamente, revelando alguns poucos gemidos dos soldados que ainda estão vivos após a violenta colisão. Um deles ergue-se por entre os escombros, ferido e me vê.

Mas não estou sozinho. Há dois outros comigo: uma garota de cabelos negros cacheados, de pele chocolate e um rapaz mais jovem, um adolescente de cabelos escuros e cada olho tinha uma coloração diferente: cinza e vermelho.

O soldado nota que algo de peculiar existe em nós. Parecemos jovens, mas ao mesmo tempo muito antigos, com roupas elegantes. O overfrock de nossa farda é de veludo e um brasão dourado na lapela direita em forma de uma rapina salta como um ponto luminoso na escuridão. Como nossos olhos.

- Q-quem são vo-vocês? - A voz do garoto soa trêmula. As palavras cuspem sangue, gotas vermelhas escorrem e juntam-se em seu queixo pequeno. Engasgou, percebendo que está ferido de maneira fatal.

- Oh, pobrezinho. Acho que ele se machucou. - A garota ao meu lado tomba a cabeça para o lado e coloca o dedo na boca, fazendo biquinho. Suas botas cobrem até seus joelhos e refletem a luz da lua. Ela anda até o soldado, curvando-se, tocando no rosto do rapaz.

- Drarynina, só falta você beijá-lo!

- Poupe-me, Román! - Drarynina olha para trás por cima de seu ombro, fitando o mais novo entre nós, Román, o único com bom-humor suficiente para respondê-la com um sorriso quase sarcástico no rosto.

Tiros soam. Román é alvejado de repente. Ele cai para trás, às gargalhadas. Reviro os olhos enfadado. Humanos. Por que precisam responder com tanta fúria? Drarynina vira-se em tempo de ver um segundo soldado, segurando seu fuzil e parte para cima dele com velocidade, fincando suas unhas na jugular do soldado, que, de joelhos, observa apavorado os caninos de Drarynina crescerem pontiagudos. Ela o abocanha, ele grita e treme, como se pedisse perdão. Eu acho que ele deveria mesmo pedir perdão, mas a morte é um castigo interessante para esse tipo de ultraje.

- Vampiros! Vampiros! - Outro soldado berra, afastando-se dos escombros.

O soldado começa a correr, procurando escapar e sobreviver do outro tipo de predador que a guerra acordou dos lugares mais ocultos do planeta. Nós.

Nós somos os predadores que ocupam o topo da cadeia alimentar, somos mais ágeis, mais fortes e agraciados com um poder que humanos não sonham em reproduzir. Somos quase deuses. Quase. Alguns preferem nos chamar de demônios. Penso que dá no mesmo.

- Vamos, por aqui! - Outros homens seguem o soldado fujão, um deles mancando, auxiliado pelos outros. Esse sentimento de solidariedade os atrasam e é a razão mais forte pela qual os humanos morrem e perdem essa guerra.

Apesar de termos organismos semelhantes, com pequenas diferenças, nós e os humanos não somos nada parecidos quando o assunto é solidariedade. Se há um fraco entre eles, os mais fortes são obrigados a ajudar pelo senso de ética e de moral. Entre nós, o mais fraco é desmembrado, simplesmente. Particularmente não compreendo o que leva um humano a ter condolências pela fraqueza alheia, eu tenho asco.

Alguns soldados impossibilitados de se mexer entram em desespero, enquanto seu colega bate os pés no ar, sendo sugado até o fim por Drarynina. Gritos, pedidos de perdão e para que poupemos suas vidas urgem entre o silêncio da noite.

Ah, o horror! Algumas vezes, os gritos desesperados de fuga causam prazer aos predadores. A adrenalina da perseguição é capaz de esquentar o sangue, como um elixir viciante. Para mim, não há nada mais entediante em como os humanos encaram a morte, tão sem dignidade, mijando nas calças. Nem ao menos se esforçam para merecerem viver.

Román fica em pé. Os projéteis podem ferir sua pele, mas não são (e nunca serão) eficientes para matá-lo. O que leva um desses soldados a achar que um tiro poderia ser fatal? Suas armas são ineficazes contra os alienígenas, parece lógico que não seja eficar também contra aqueles que podem contra os alienígenas, não concorda? Román corre atrás dos soldados que tentam fugir, dá um salto e os alcança sem muito esforço, pulando em cima deles como um leopardo. Abocanha um, depois o outro. O terceiro, que estava mancando, grita apavorado e como uma moça, arrastando-se com o quadril dali.

Que tédio. A confusão e o exagero teatral da juventude chega a me cansar o ânimo. Afasto-me daquele espetáculo circense e caminho pela lateral do furgão, observando os poucos soldados que ainda restam por ali, a maioria inconsciente, outros até sem vida. Um banquete.

A maioria dos vampiros tem preferência por atacar suas vítimas ainda vivas e sugar as Gotas da Morte. São as mais poderosas, é quando a energia se rompe em suas almas, um extinto de sobrevivência, uma rebelião do próprio corpo. Há limitações em sugar o sangue de um cadáver, inclusive, caso o sangue esfrie e a energia se dissipe, tem gosto de veneno e o efeito seria contrário ao que buscamos: alguns de nós nem ao menos sobreviveriam.

Curvo. Abocanho dois ou três soldados, sugando todo seu sangue, até a última gota e até que eu escute seus corações pararem. Nada me satisfaz, simplesmente. A fome urge em minha entranhas, uma verdadeira maldição e a necessidade de sangue queima o estômago.

Quando começo a beber sangue raramente paro. Dificilmente paro. Eu nem ao menos tenho controle da minha fome, sou pior que um animal descontrolado. Sozinho, poderia dizimar cidades inteiras apenas de passagem e ainda assim, sentiria fome. Sabe quanto esforço físico é necessário desempenhar para cessar o banquete quando a fome nunca cessa? O tipo de esforço físico que fui treinado para ter, não importa o quão exausto e sedento eu esteja, preciso lembrar-me de que não tenho direitos à saciedade.

Ademais, para que eu me saciasse seria preciso cometer um crime. O tipo de crime que meu pai cometeu quando sugou até a última Gota da Morte de minha mãe. O tipo de crime imperdoável entre os de nossa espécie.

A possibilidade me assombra. Sabe qual o meu maior medo? Não ser capaz de me controlar até que eu engula todo o coração da pessoa que mais amo. É por isso que ninguém nesse universo é capaz de roubar minha dignidade ou de me ameaçar o suficiente. O pior que me pode acontecer não depende de mais ninguém, além de mim.

Foi o que meu pai me disse antes do Imperador mandar decapitá-lo.

É assim que um vampiro paga quando mata outro(1): o preço é a própria vida. A cabeça do meu pai rolou com a Lua em pino em praça pública, para servir de exemplo. Minha irmã mais nova chorou em soluços, eu apenas senti conforto por meu pai, minha tia estourou um tapa ardido na minha face, pois eu não deveria ser tão frio. Meu irmão mais velho, por sua vez chorou como uma criança naquela noite.

E por quê? Eu nunca entendi.

A morte era uma alternativa melhor. Ele havia se privado da própria dignidade e honra, ao menos estava livre de ter que arcar com as consequências e a própria vergonha de ter sido tão fraco.

Escuto um gemido. Há mais um corpo, distante. O rastro de sangue segue até uma pedra alaranjada, da cor da terra, onde há um soldado apoiado, quase morto e já quase sem sangue. Não é o cheiro de comida que me atrai, mas a curiosidade. Ele não é muito jovem, tem bigode e o rosto cansado. Talvez fosse o encarregado do batalhão. Seu olhar é lânguido e perdido em um papel que ele mal consegue segurar.

Chuto um pedregulho na direção do homem. A pequena pedra para no meio do caminho entre eu e o soldado, ele ergue os olhos e me vê, mas não parece desesperado ou assustado, nem mesmo demonstra medo diante de minhas presas ou os olhos que brilham na escuridão. O homem parece calmo, me intriga, mais interessado em sua fotografia do que na morte.

O que é mais importante?

Já que é assim, ataco-o. Derrubo a carcaça seca, diante de meus pés. Ele não tinha muito para oferecer, mas é melhor que eu pare agora. Limpo a boca com as costas da mão e procuro pelos bolsos até achar o maço de cigarro. Bato a pequena caixa nas mãos, um cilindro de tabaco se ergue. Equilibro-o na boca, entre os lábios.

Ainda escuto os gritos de outros soldados sendo atacados por meus dois colegas, Drarynina e Román. Preciso de um isqueiro. Maldito Román. Ele pode fazer o fogo surgir em seus dedos. Eu não.

Encaro a ponta do cigarro com insatisfação, procuro por um isqueiro nos bolsos e encontro, finalmente. Acendo. Trago e solto fumaça, esperando a nicotina agir o suficiente para intoxicar meu sangue e segurar o apetite. Uma merda de vida, isso sim. Seguro o cilindro branco de fumo com dois dedos e olho para o chão.

Ah, a fotografia. Quase me esqueci. Presa na ponta da bota está o tesouro de minha última vítima. O que é mais importante para os humanos? O que a morte deixa saudades? Gostaria de não saber a resposta. A fotografia flamula, um convite para eu segurá-la. Abaixo e pego o quadrado de papel, fitando-o por alguns momentos, enquanto ergo novamente meu corpo, ficando em pé. Não me surpreende que seja uma mulher, loira, jovem, segurando um bebê com laçarote vermelho na cabeça.

- Hm, muito novinha para você, não acha, Devon? - Drarynina apoia-se em meu ombro, encostando o queixo na mão e sorrindo adoravelmente, embora seus traços não sejam tão encatadores quanto o de sua irmã.

- Eventualmente, ela crescerá. Se tiver sorte de sobreviver a este inferno, poderá se tornar ainda mais velha que eu. - Solto a fotografia na corrente de vento, deixando que ela voe para longe.

- Mais velha que você? Seria impossível, meu amigo.

- Onde está Román? - Corto o assunto. Não tenho paciência para conversas sociais durante uma operação.

- Lá atrás, "roendo ossos". - Drarynina dá uma risadinha de deboche.

- Vá chamá-lo, temos poucas horas até o amanhecer.

- Román! - Drarynina grita quase ao meu ouvido e se afasta. - Às vezes eu me sinto como sua mãe! - Ela faz uma pausa e posso até imaginar Román agarrado ao pulso de um soldado, deixando o corpo totalmente seco. - Oh, por favor, você parece um morto de fome!

- Tenho apetite, só isso! - Román protesta. Ele é jovem, ainda precisa de muito sangue, mas logo o apetite irá diminuir e ele será capaz de manter suas forças por mais tempo no corpo. Os mais velhos podem espaçar mais o tempo entre refeições de sangue, mas em compensação, sugam mais. Eu serei desse jeito para sempre, nem mais nem menos, simplesmente insaciável. - Quer um pouco?

- Estou satisfeita, muito obrigada.

Eles se aproximam de mim logo depois, Román com os braços ao redor dos ombros de Drarynina e ela vem emburrada, como sempre. Uma ótima soldado em batalha, apesar do ego.

Trago o cigarro e fito a estrada, por onde caminharemos até chegar ao vilarejo mais próximo, sob ataque alienígenas. É possível ver ao fim do horizonte uma abóboda de luzes piscando, acendendo a névoa que chamamos de Pó de Anjo. Uma névoa mortal que os alienígenas disparam aos montes ao redor do planeta. Odeio esses alienígenas.

- Não é irônico que estejamos lutando para proteger esses humanos, mas os matamos quando nos alimentamos deles? - Román pergunta. - Para que nos esforçamos tanto?

- Não estamos salvando-os. - Tiro o cigarro da boca, expelindo fumaça.

- Não? - Román olhou para mim franzindo o cenho.

- Estamos tomando de volta o controle do planeta. - Jogo a bituca de cigarro no chão e piso em cima, limpando os dentes com a língua.

Drarynina sorri com a ideia. Román se satisfaz com a resposta, mesmo que eu possa ver o quanto ela não faz o menor sentido para ele.

Dou os primeiros passos em direção ao vilarejo e, juntos, caminhamos.

 

 

(1) Frenesi é o nome do crime em que um vampiro bebe o sangue de outro vampiro até a morte. O processo é conhecido por devorar a alma do vampiro "sugado". Além de perder um pouco de humanidade, o vampiro que comete o Frenesi também se torna mais forte. O ato é considerado canibalismo, o crime mais hediondo que um vampiro pode cometer contra sua espécie.

Sugar o sangue, mas sem matar, é conhecido como "Ósculo", é uma prática sexual mais prazerosa que o ato carnal em si.

(Continua)

 

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Gente, seguinte, essa história se passa alguns anos antes de "Escrava de Sangue"! Vou abordar algumas coisas que não vão conseguir destaque pelo ponto de vista da Jaylee na outra história, como a guerra contra os Alienígenas (Anjos) em seus primórdios.

 

Atenção, essa obra, personagens e cenário encontra-se registrada e protegida em mais de 168 países através de registros nacionais e internacionais (Organização Mundial de Propriedade Intelectual, FBN e Creative Commons - PROIBIDA A REPRODUÇÃO). O uso indevido do todo e partes desse livro/história/personagens é suscetível a penalidades jurídicas. (c) a Mariana Mello Sgambato - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - 13 de Abril de 2015. Plágio é Crime. Não copie. *** Leis de direitos autorais (Lei 9.61), com pena de multa ou detenção de 3 meses a um ano. Portanto, informo que a reprodução total ou parcial desta é proibida em qualquer meios ou fins, sob risco de acusação penal. ***  

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Parte 02 - Resgate

Parte 02 - Resgate

Os tiros soavam em seco, projeteis em formas de olgivas de chumbo de um lado, do outro, raios e energias dirigidas, que até o ataque alienígena figuravam apenas os livros de ficção e brilhavam em branco iluminando o denso nevoeiro. Um "bzzzz" de eletricidade incomum, mas familiar o suficiente para nós reconhecermos: O som da guerra.

Soldados humanos contra alienígenas.

Acomodo o respirador de dois filtros em meu rosto. Drarynina e Román fazem o mesmo. As máscaras ajudam, mas não é uma proteção cem por cento eficaz. O nevoeiro, ou Pó de Anjo, é cheio de partículas capazes de ferir vias respiratórias e intoxicar tanto o sangue de humanos quanto o de vampiros. Respirar doses altas é letal para todos, mas a diferença é que com um pouco de sangue, nós os vampiros, somos capazes de nos regenerar de doenças e ferimentos. Já os humanos sucumbem.

E eis o verdadeiro problema: se a humanidade for totalmente extinta da face do planeta, perderemos o único recurso que nos manteve vivos ao longo dos milênios: sangue humano. Alienígenas não têm sangue, têm hemolinfa.

O Grande Império se proclamou: a segurança aos humanos deve ser restabelecida e as colônias, tão esquecidas no mundo moderno, devem voltar a existir. Agora que deixamos a sombra das lendas, humanos são escravizados em nossas colônias. O que fizemos no entanto foi apenas escancarar um sistema que já existia no subterrâneo, enquanto estávamos vivendo sob Sigilo.

Estivemos sempre ao redor dos humanos, permeando suas fantasias, apenas resolvemos deixar claro que somos reais.

Com os alienígenas dizimando pessoas, o Grande Império sentiu como se seu território fosse ameaçado e que alguém estava mexendo em seu estoque de comida. A outra opção era que assistíssemos de braços cruzados enquanto esses seres do céu destruíssem os humanos, mas estaríamos desistindo de nossa vida se o fizéssemos. Nós, vampiros, não consideramos a derrota como opção.

Adentramos o nevoeiro e caminhamos por vielas, subindo o morro. Nossa operação consiste em resgatar sobreviventes, caso haja, e levá-los para a colônia mais próxima. Os humanos que antes viviam aqui estavam entregues à miséria e às precárias condições de vida, o cheiro podre de esgoto denuncia que não há saneamento básico. Que espécie é essa? Uma espécie animal que não cuida de si mesmo, predatória em sua própria comunidade. Se os seres que vieram dos céus não tivessem interferido, certamente essa seria uma espécie que se auto-extinguiria. Como o experimento Universo 25 de John Calhoun.

Os sons de explosão ficam mais perto e nos guiamos até eles. Rapidamente alcançamos o núcleo da batalha, em uma praça. Os soldados humanos haviam improvisado flancos e atiravam desesperados contra um dos Anjos.

Anjos, haha.

Esse foi o nome que deram aos alienígenas logo que eles chegaram, assisti pela televisão do meu apartamento em TriBeCa. Sim, eu estava lá, acho que fiquei lá cerca de três meses... quem se importa? Manhattan está sob escombros. Eu estava falando dos Anjos. Foram apelidados assim pela própria população, afinal, vieram dos céus, destruiram humanos e purificavam o ar, a terra, as águas. Falou-se em Apocalipse.

Não é irônico? Aqueles que destróem os humanos ganham fama de bonzinhos e nós, aqueles que os resgatamos da lama, somos os demônios. Os valores da sociedade humana são do avesso! Eu não tenho paciência com humanos, mas não posso simplesmente deixá-los se extinguir. Eu não ousaria.

Abaixado na sacada de uma casa pela metade, olho para um deles agora, no centro da praça, recebendo os tiros. Não consigo relacionar como seres tão grotescos podem ser anjos. Eles possuem dois pares de pernas, um exoesqueleto branco protege seus orgãos, dá para ver tudo através do liquido furta-cor por dentro da membrana transparente que segura tudo. Como insetos, possuem dois pares de asas como as libéluas, três ocelos no centro da cabeça e uma boca como a de um polvo. Eles não voam, exceto quando estão em suas naves espaciais giratórias e em pé, chegam a ter três metros.

Há um casal no centro da praça, onde há uma fonte com estátuas de querubins. O macho protegendo a fêmea dos tiros. E sei que é uma fêmea apenas porque ela está colocando um ovo de formato comprido e alaranjado. Os ovos são colocados sempre em água, submersos, eles brilham no escuro como luzes neon. Quando a membrana explode um alien bebê ganha vida. Eu nunca vi um bebê extraterrestre antes, mas minha curiosidade é menor que minhas ordens. Alienígenas não podem se reproduzir.

Sinalizo para Román. Quero que ele destruia a fêmea, mas o macho irá protegê-la, precisarei que Drarynina fique atenta, quando o macho se virar para Román, ela precisa refletir os golpes e quando ele me der as costas, estará morto. Eu não tenho misericórdia por meus inimigos. Aliás, eu não tenho misericórdia por ninguém.

- Pssst! - Algo chama nossa atenção antes de agirmos.

Uma garotinha de seis anos, no máximo, magra como se passasse fome, sem sapatos e com apenas uma camiseta de adulto cobrindo o corpo. Os joelhos são como duas bolotas em cima de dois gravetos e os olhos contém sulcos como se estivessem afundados. Mas são sobreviventes e eles são nossas prioridades.

Cutuco Drarynina. Ela faz os contatos sociais.

Algumas unidades de elite acham uma besteira tremenda perder tempo com crianças abaixo de dez anos, eles compreendem que idosos são mais valiosos, pois possuem mais sangue e até o fim de suas vidas alimentariam vampiros por semanas, ou meses, desde que não fossem anêmicos. Eu discordo. Como discordo de quase tudo, por sinal. É uma estratégia mais eficaz priorizar crianças, jovens e adultos até trinta anos. Não são investimentos imediatos, são para o futuro. Ao menos o Grande Império concorda comigo nesse ponto.

- Ei, querida! - Drarynina caminha abaixada até a menina, como um animal de quatro patas. A menina fica parada, olhando para ela. - Onde está sua mãe? - E a menina responde um "não" silencioso, acho que morreu. - Você está sozinha? - A menina faz não de novo. - Onde estão os outros? - Ela aponta longe, do outro lado da praça, há inúmeros prédios.

Cautelosamente analiso as construções, um prédio largo, de mais ou menos cinco andares tem um buraco lateral, grande o suficiente para pessoas passarem, pequeno o suficiente para impedir os Anjos de entrarem. Como estão sobrevivendo ao nevoeiro? Não sei, talvez muitos estejam feridos. E se for o caso teremos que chamar pela unidade de exército mais próxima.

Odeio pedir auxílio à qualquer unidade do exército. Meu irmão é o oficial encarregado dos principais regimentos e ele sempre, sempre, sempre dificulta a minha vida. Dorian não consegue lidar com o fato de que me destaco nas operações ou que sua futura noiva prefira minha companhia à dele. Bem, ele deveria ter pensado nisso antes de ter apresentado interesse de noivado com Cassie. Além do mais, eu era um homem casado até pouco tempo atrás.

- Vá com ela. - Sussurro para Drarynina.

Ela acena que sim e vira para a menininha:

- Você me levaria lá? Para ver seus amigos?

A garotinha faz que sim, Drarynina dá a mão para ela como uma professora faz no jardim de infância e a segue para dentro da casa em que estamos. Eu e Román ficamos sentados na sacada, aguardando Drarynina enviar um sinal. Assim que algo pisca do buraco que há no prédio, sabemos que é hora de seguir para lá.

Atravessamos por dentro dos escombros. A guerra na praça ecoa em tiros secos. De vez em quando, uma explosão de granada é escutada.

No pequeno buraco usado refúgio, contamos cinquenta pessoas, um dos maiores números de pessoas que já encontramos escondidas por escombros. Um prédio ruiu como uma avalanche em cima das pessoas, poucos sobreviveram e alguns estavam presos de forma a me fazer duvidar sobre como ficaram com vida. Duas crianças foram encontradas em baixo de uma mesa com estrutura de metal, mas a sorte foi que a parede que tombou não os esmagou, porém bloqueou a saída.

Haviam mães e crianças choronas, alguns jovens, muitos adultos e nenhum idoso. Acho sempre estranho como encontramos crianças e mães em maioria, junto com idosos. Os cautelosos sempre sobrevivem, já os jovens e imprudentes, acabam sempre mortos nos primeiros segundos.

Porém, cautela em demasia também trás a morte mais rápido. Duvido que os humanos sejam capazes de encontrar equilíbrio, eles sempre vivem em exageros.

- Entre em contato com o regimento e avise que precisamos de caminhões para o resgate. - Aviso Drarynina. Ela acena com a cabeça e aperta um botão no dispositivo que parece um fone de ouvido, preso na orelha, prateado. Viro para Román. - Temos que explodir aquele ovo antes que ele choque.

- Vou conferir o perímetro e volto com informações. - Román pula a janela, com um sorriso, animado com o serviço. Ele é um soldado que sabe se divertir no campo de batalha. Eu era assim quando jovem.

- Devon... - Drarynina se aproxima. - Eles vão enviar apenas um caminhão, mas teremos que andar treze quilômetros para o oeste. Eles não virão mais perto.

- Temos até o amanhecer. - Faço parecer que é tempo demais, mas na verdade, estamos quase sem tempo. - Vá na frente.

- Sim senhor.

Eu olho para fora, pela fresta, conferindo a praça. A batalha está quase decidida, os alienígenas estão ganhando.

- Não! Não! - Uma mulher grita, segurando o seu bebê de dois anos no colo. Ela está ferida e com o tornozelo quebrado, não tem como ela caminhar e carregar seu bebê, mas luta contra Drarynina que tenta tirar a menininha dela.

Não tenho paciênca para assistir. Às vezes acho que Dorian está de brincadeira quando assina as missões que designa para mim, são longe, outras equipes poderiam chegar primeiro que nós. Sei que ele quer me manter o mais longe possível do quartel, mas chega a ser ridículo! Se eu descobrir o que ele está tramando, não haverá perdão.

Román retorna logo em seguida, ele acha que quando os tiros cessarem teremos vantagens, mas não dispomos de tempo para esperar. O caminhão já foi chamado e o silêncio chamaria atenção dos alienígenas para os humanos. Eles são barulhentos enquanto caminham.

Decido que iremos nos movimentar durante os ataques, contornando a cidade e fugindo para a estrada. Tem tudo para dar certo, mas nos olhos dos humanos só há pavor.

Passamos as instruções, eles prestam atenção e sabem que a única chance de sobreviverem é nos escutarem e colaborarem. Oferecemos segurança e mesmo em uma vida de escravidão é o que eles têm.

- Vamos com eles mamãe? - Uma menina loirinha pergunta à sua mãe, que não consegue dizer que sim sem derramar lágrimas.

Como você olha para seus filhos e diz que não há opções, que ou você aceita o que oferecem, ou todos morrerão?

- Se quisermos viver iremos. - A outra mulher ao lado da garota quem responde, com a firmeza de uma rocha.

Acho que isso resolve.

- Vamos! Todos de pé, lembrem-se de seguirem os comandos e não saiam da área do escudo. - Drarynina grita, chamando a todos. Sua voz sobressai-se entre os tiros. - Agora! Movam-se.

Os humanos obedecem. Ensinamos a eles os comandos e gestos que usamos, quando parar, quando correr, quando se abaixar, quando rastejar. Duvido que pessoas passando fome tenham conseguido decorar tudo, mas pretendo usar apenas dois comandos: corra e pare.

Román saí na frente puxando os mais jovens, Drarynina no meio segurando o escudo e eu atrás, arrastando os mais velhos.

Por causa dos tiros as crianças choram e suas mães as pegam no colo, mas não param de chorar. Se tivéssemos esperado a pausa, agora todos estariam mortos, pois os choros atraíriam os Anjos.

Seguimos em direção a estrada, andamos devagar, muitos bebês e idosos. As mulheres seguram firme suas crianças para não se perderem, fazendo o máximo para protegê-las. Consigo me relacionar com isso. É universal, acho que qualquer um com uma alma consegue.

Alcançamos a estrada com segurança, a humanidade comemora, mas não tenho motivos para comemorar ainda. Peço que façam silêncio e apenas caminhem, apressando os passos.

Quase duas horas depois estamos sentados no meio da estrada sem fogueira, a única luz é uma lanterna que um moleque tinha e funcionava por ser de corda. Os farois de um aerobus de resgate caem sobre nós.

Agora sim, podem comemorar, mas os humanos estão cansados e famintos, apenas olham aliviados para o resgate e não conseguem dizer nada.

Dentro do ônibus em direção ao quartel-general, apenas penso em voltar para a única coisa que me importa...

***

- Devon?

Ou talvez, possa esperar.

Giro, encarando dois grandes e redondos olhos da cor do sangue. Na boca suculenta e carnuda de lábios avermelhados como a casca de uma maçã brota um sorriso.

- Cassie? - Minha vontade é abraçá-la e beijá-la, mas não poderia fazer isso sem chamar atenção indevida.

Estamos no meio do pátio descarregando humanos. O Aerobus está ligado, os farois acesos iluminando e soldados se aproximam para acompanhar os resgatados e guiá-los para os acampamentos, onde é feita a triagem e depois eles são encaminhados para diversas colônias. Estamos em um quartel de resgate, há vários desses espalhados pelo país

- Não esperava ver você aqui. - Ela coloca a mão na cintura, usando a farda que molda-se em seu corpo cheio de curvas, atraindo meu olhar para o quadril. Mas o que existe de melhor em Cassie são seus seios fartos.

- Estou de passagem. Acabei de chegar com resgates.

- Ugh, ainda fazendo missões desse tipo? O Conselho deve estar mesmo irado com você. - Ela provoca, se aproximando de mim e com o dedo, dá petelecos na lapela do meu casaco, onde o brasão do esquadrão está.

- Sabe que sim.

- O grande e destemido Devon Riezdra, resumido a uma unidade de resgates. - Cassie morde o lábio inferior com seus dentes grandes e me deixa imaginando o que mais ela pode fazer com essa boca. - Tem um lugar para dormir? Pode sempre se deitar na minha cama.

- Claro, por que não? Então o Conselho daria uma descarga em mim de vez, e eu poderia fazer unidunitê se coloco chifres no meu irmão ou no Imperador.

Ela dá uma risada divertida e seus olhos até brilham com o vislumbre da possibilidade.

- E em quem você colocaria?

- A ideia de aborrecer meu irmão é muito tentadora, mas gostaria de ofender Kaiser expondo-o ao ridículo. - Deslizo a mão por seu ombro, pelo braço e a linha da jaqueta por seu seios. - Entretanto partilhar algo com aquele homem é o que mais desagrada.

- Os rumores apontam que ele tem preferência por Misha.

- Por que acha isso?

- Porque pedi a ela para fazer. Se ela o conquistar estarei livre para Riezdra, daí é sua jogada, meu amor.

- Acha que Kaiser vai cair de amores por ela?

- Se não for por ela será por mim, então podemos fazer uma troca de identidades. Apenas certifique-se de que estará pronto quando chegar a sua vez.

- Estou sempre pronto, querida.

- Falando nisso, porque não vamos para meus aposentos? Podemos pedir pizza, Zane adora pizza e você também, e eu adoraria cuidar dos cabelos de Lisa, da última vez, sua ex-esposa a deixou com piolhos.

- Adoraria, será melhor que passar a noite perto dos aposentos de Zegrath

- Zegrath não está.

- Como não? E Zane? Aquela vadia o levou sem me avisar?

- Ele não está com você? - Cassie abre bem os olhos assustada. - Não está com ela, é uma certeza. Avistaram-na sozinha em S-17 dias atrás.

Preciso de alguns segundos para colocar os meus pensamentos em ordem e entender o que sucedeu. Deixe-me explicar a vocês porque estou em choque:

Celeste e eu nos separamos como dois inimigos, o que resume bem a nossa relação. Fui forçado pela família a me casar com ela e como forma de protesto nunca a tratei como minha esposa. Ela tentou e tentou muito, houve pequenos dias de paz entre nós durante anos de guerra. Na adolescência eu e Cassie nos apaixonamos e temos namorado sem permissão desde então. Se Celeste imaginou que ao se casar comigo eu pararia de me relacionar com Cassie, ela se enganou, mas eu não vi a amargura que criei em Celeste durante esses anos e só compreendi o tamanho da minha encrenca quando Celeste pediu o divórcio e tomou meus filhos de mim. Celeste me desmoralizou perante os Nobres, me descrediblizou diante do Conselho e conseguiu sua vingança quando me puniram rebaixando meu Esquadrão e colocando-me nas missões mais ridículas. Eles esperam que eu morra no campo de batalha.

O que ela fez com meus filhos?

Não sou Príncipe do meu clã, meu irmão é. Eu não tenho permissão para ter filhos de nenhum tipo, motivo pelo qual meus dois filhos adotivos, Zane e Lisa, não possuem registros oficiais e não são reconhecidos na Sociedade dos Vampiros. Eu quase não consegui inserí-los na Sociedade no começo e apenas consegui autorização para criá-los porque meu irmão e amigos influentes intercederam. Zane seria candidato a ser Sucessor da Casa Riezdra, se Dorian não estivesse tão empenhado em ter filhos com a minha namorada. Meus filhos não possuem valor, não posso barganhá-los, mas eles são meus.

Não gosto de dividir minhas coisas. Muito menos que as tomem de mim.

- Talvez estejam com seu irmão. Ou foram enviados para Izobel. - A voz de Cassie me trás de volta à realidade e eu odeio o som dela agora. - Ou talvez tenham sido enviados para uma colônia, são humanos, saem comboios daqui de hora em hora.

- Cassie! - Grito. Ela se cala e olha para mim assustada. - É a pior das hipóteses.

- Não, Devon, a pior das hipóteses... - Espero que ela não verbalize. - É considerar que ambos estão mortos.

Exalo ar pela boca. As luzes do Aerobus explodem. Aí está. Ela disse. Agora não posso ignorar o que possa ter acontecido.

- Celeste me paga. Se Zane tiver um arranhão, vou separar a cabeça dela do corpo. - Viro as costas e passo pelos soldados que acendem lanternas para iluminar o caminho.

- Devon! - Cassie vem atrás de mim.

***

Não posso realmente separar a cabeça da minha ex-esposa do corpo, mesmo querendo muito fazer isso. Ela é a Sucessora da Casa Zegrath, eu estaria cometendo um crime sem tamanho e seria enviado para as Masmorras. Quem cuidaria de meus filhos, nesse caso? Isto é, se eles estiverem vivos.

- Eu não sei o que posso fazer. - A voz de Dorian soa pelo dispositivo de comunicação do exército.

Três dias. Esse foi o tempo que levei para conseguir acesso a um terminal de comunicação. Não há muitos desses disponíveis pelo Império. A guerra está acirrada e há um ponto de comunicação em cada colônia, apenas. Nem preciso dizer quantos protocolos eu quebrei para conseguir falar com Dorian e essa é a resposta que ele tem para me dar? Não posso admitir isso.

- Por favor, Dorian. - Estou rangendo os dentes.

Ergo um pouco a cabeça e o soldado na minha frente, atrás do balcão onde o dispositivo está conectado, olha para mim e posso ver que ele segura uma risada por me ouvir dizer "por favor". A fama é que não sou uma pessoa muito gentil. Fulmino o soldado com o olhar, ele se abaixa um pouco e projeta uma postura de seriedade, pigarreando.

- Devon, você precisa considerar que Zane esteja morto. - A frieza com que ele consegue verbalizar essa questão até me ofende!

- Não criei meu filho para ele morrer assim.

- Soldados treinados morrem, quanto mais uma criança.

- Dorian...

- É meu dever considerar todas as prováveis hipóteses antes de concentrar esforços para um resgate ou qualquer outra ação.

Olho novamente para o soldado, ele está prestando atenção na conversa. Viro de costas para ele e aproximo a mão do bucal com o microfone.

- Estou implorando.

Uma risadinha explode atrás de mim. Reviro os olhos.

- Consegue garantir que ele entrou no comboio?

- É o que disseram. Román checou as informações. Ele entrou em um Aerobus, com Lisa e então o ônibus partiu. Eu não sei o destino, ninguém sabe. Foi a última vez que alguém o viu.

- São vinte e cinco dias de escurdão. - Ele faz uma pausa, não consigo dizer nada agora e coloco a mão na testa, sou um saco de desespero e Dorian é minha única esperança. Ele deve saber que para eu estar pedindo ajuda, é porque já não sei mais o que fazer. Dorian suspira, ponderando e eu espero que esteja lembrando-se de todas as vezes que ele esteve com Zane. Dorian carregou meu filho nas costas de cavalinho muitas vezes e Zane sempre foi muito amigo de Caedyn, filha de Dorian. Ele precisa me ajudar nessa. - Escalarei alguns soldados para cruzar dados de registros em acampamentos, se alguém mencionar o nome de Riezdra...

- Ele não faria. Inventaria outro sobrenome, algo totalmente tosco como... Smith & Wesson. Você precisa checar pelo primeiro nome, com certeza deram entrada juntos.

- Eu sei fazer o meu trabalho, Devon. - Dorian me repreende. - Se houver qualquer menção a Riezdra, localizarei.

- Dorian... - Eu o chamo, fecho até os olhos. Meu irmão precisa entender isso. Ele faz um "hmm" em seco da outra extremidade do comunicador. - Prometa que procurará pelo primeiro nome. Eu vou atrás de qualquer Zane que você registrar, em qualquer lugar. Apenas me prometa. - Coloco a mão no rosto, entre os dedos, olho para o cubículo. O soldado abaixa a cabeça.

- É um nome comum, Devon, haverá toneladas de endereços... Não saberemos nem se é o mesmo passando por vários lugares. - Dorian me alerta. Eu sei disso. Os registros são precários, cada colônia trabalha de um jeito, é o que dá para fazer, as cidades foram dizimadas. - Tem certeza?

- Dou a volta no planeta se for preciso. Só consiga os registros. - Sentencio.

- Tudo bem. Envio para você em alguns dias. Tente não fazer nada estúpido. De novo.

Tenho vontade de xingá-lo, mas preciso da ajuda de Dorian, se eu o ofender, posso esquecer qualquer boa vontade que ainda restou nele.

- Obrigado, meu irmão.

- Estou fazendo isso por Zane. - E ele desliga.

Respiro fundo e forço um sorriso sem mostrar os dentes para o soldado, entregando o dispositivo de comunicação para ele. Assino um papel idiota e viro, dando as costas para o soldado. Antes de sair do cubículo, volto, olhando firme para ele:

- Da próxima vez que você der risada... Considere-se morto.

Ele fica pálido e eu deixo a sala.

- E então? - Román está mordendo um pedaço de couro, encostado na parede do cubículo, ele me olha ansioso e se endireita, ficando ereto.

- Dorian vai enviar uma tonelada de nomes, qualquer um que ele encontrar. Será impossível.

- Nós dividimos. Eu e você. - Román soa convicto. - Quem encontrá-lo primeiro paga uma garrafa de vermouth para o outro. - E dá um sorriso.

- É tanto otimismo que quase me contagia.

- Sei que o cenário é ruim, mas é de Zane que estamos falando. - Román se aproxima de mim e tira o pedaço de couro da boca. - O mesmo garoto que convencia o baleiro a dar doces grátis para todos. Você se lembra disso? Eu me lembro. Zane sabe como conquistar a todos.

- Você não está ajudando Román. - Estreito os olhos e ranjo os dentes, irado.

- Não? O que eu fiz?

- Acabou de me dar mais um motivo para me preocupar.

 

(Continua)

 
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Parte 03 - Sem glória

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Parte 04 - Rejeição

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Parte 06 - Traição

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